terça-feira, 12 de maio de 2020

PERCEPÇÕES ACERCA DA IMPRENSA, AUTORIDADES E ESPECIALISTAS NO TRATO DE QUESTÕES REFERENTES À PANDEMIA

Por Lúcio Torres

Achar que a imprensa daria um tratamento imparcial à pandemia do coronavírus é não compreender que não existe discurso isento de ideologia e, como tal, ela reproduz em seus noticiários, reportagens e editais a dicotomia política em que se encontra a sociedade brasileira. Esta dualidade acabou por prejudicar a necessária condição de serenidade que o tratamento da crise de saúde pública exige no seu enfrentamento e desenlace.
Quando se estuda Análise de Discurso, um dos princípios com os quais se depara é aquele que prega que não há nos processos comunicativos manifestos pela linguagem verbal textos isentos dos ideais presentes naqueles sujeitos cuja intencionalidade se faz manifesta. Aliás, a intencionalidade da fala e do uso da língua foi por demais estudada e compreendida nos estudos linguísticos de diversos autores e especialistas no assunto. Por falar em “especialistas”, estes são requisitados à exaustão pela imprensa quase que como detentores de unanimidade. Mas isto será tratado logo mais.
O momento político pós-eleição - a qual parece não ter terminado - deixou como legado perverso a incapacidade da sociedade de estabelecer critérios de pensamentos isentos da ideologia ideológico-partidária. A imprensa acaba por também fazer parte deste palanque eleitoral interminável, tendo em vista os interesses de determinados meios de comunicação subjugados pelo atual governo e as rusgas existentes de ambas as partes de tal situação advinda, leia-se Rede Globo de Televisão e Folha de São Paulo, principalmente. Imagino que o leitor esteja agora ponderando que o presente texto é um texto pró-governo, haja vista ter mencionado os interesses prejudicados das referidas empresas. Isto só confirma a mencionada dicotomia social de que, quem não é a favor de um, é do lado do outro. É lamentável tal pensamento. Ele é, por fim, o motivo pelo qual estamos nesta situação tão perversa de não saber que rumo tomar, e acabando por andar em círculos. Infelizmente, os que assim pensam se surpreenderão ao ler o texto até o final.
Ao se buscar um contraponto em outros veículos comunicativos supostamente livres de “ódio” nutrido pelo governo, esbarramos exatamente na mesma falta de isenção, desta feita traduzida pelo alinhamento ideológico e assim se confirma a premissa inicial da inexistência de conteúdos não ideológicos e sim de “interesses”, não somente no processo comunicativo, mas em todo processo linguístico discursivo. Isto por si não é problema. O problema é os meios comunicativos não deixarem claro para o espectador/leitor/ouvinte a que se destinam sua posição clara e inequívoca, o que seria, antes de tudo, ético. Ao não fazê-lo, deixa-se aqueles a quem se direcionam sem um norte, sem a capacidade de se posicionarem e estabelecerem pontes de significados e, consequentemente, de formarem sua opinião.
Voltando ao tema da pandemia, mas relacionando o que foi posto até aqui, quando não há um posicionamento explícito sobre a ideologia presente neste ou naquele veículo de comunicação, o que se produz são matérias jornalísticas que buscam satisfazer ao fim e objetivo maiores que, na verdade e infelizmente, não são o de informar, mas o de deixar marcado implicitamente seu real objetivo, às escuras, diga-se de passagem. Esta maneira distorcida de produzir informação se traduz por noticiários repletos de situações degradantes e desgraça que possuem um lamentável e mórbido desejo de disseminar o medo e o pânico, cujos interesses maiores e inequívoco escopo resvalam no governo e seus descaminhos. Chega-se a ver neles a reprodução do óbvio mecanismo do instinto de sobrevivência, pelo qual se ataca o oponente que é ameça de maneira feroz e inconsequente. Mas que responsabilidade possuem os que assim agem, desprovidos do senso de coletividade que move nações mais desenvolvidas e menos desavergonhadas?
Reflexo destas posições definidas e pré-estabelecidas de maneira a afirmar o seu status quo, é a requisição pelos diversos telejornais e afins, dos mais variados e autointitulados “especialistas” no assunto (no caso, a pandemia por coronavírus) cada qual com previsões - muitas delas que não se confirmam - que carecem de estudos realmente sérios que possam ser comparados de maneira também séria e parcimoniosa (quando não também contraditórios ensinamentos que servem para se constatar que até médicos, epidemiologista, infectologistas e outros "istas" carregam também alguma ignorância). Mas, por que haveria de ser assim, quando, de fato, o que se pretende é semear a desinformação? Antes, este é justamente o fim maior.
Por outro lado, o governo é inoperante, inábil e débil, o que favorece a exploração dos que a ele são contrários, ao extremo. É patético ver a escalada de tropeços e movimentos incendiários da trupe de Brasília, encabeçada pelo seu chefe maior; até quando a situação lhe é favorável - o que é raro de se ver - dá-se um jeito de piorar as coisas por meio de declarações inoportunas e/ou comportamentos piores ainda. Assim fica difícil. Têm-se a impressão de que o governo não precisa de inimigos, pois ele mesmo o é de si.
De outra forma, mas não menos sorrateira, perniciosa e aviltante, estão os governadores e prefeitos que querem “mostrar serviço”, pois visam ao dia 4 de outubro - notadamente os senhores João Dória e Wilson Witzel, presidencialíssimos - e qual palanque melhor poderia existir que a providencial pandemia na sua visibilidade e oposição ao governo federal? Consequentemente, e novamente seguindo “especialistas em nada”, publicam decretos, às vezes, desprovidos de coerência, estudo, método e aplicabilidade, tratando um todo com precoces e injustificadas medidas restritivas, quando somente uma parte dele as exigia naquele momento. Não pensaram assim quando permitiram a realização do carnaval (provavelmente o vírus já circulava nesta época, segundo "estudo" da Fiocruz).
   Lembra-me o fato de, em princípios de março, quando começaram a pulular atabalhoados e infundados decretos de toda a sorte: primeiro, suspensão de aulas quando do surgimento dos primeiros casos, ainda que em determinada cidade não existisse o mais remoto indício de nenhum caso confirmado do vírus; depois, proibição de aglomerações de 500 pessoas pelo governo do estado; logo após, proibição de aglomerações de 100 pessoas pelo prefeito (como que cada um tivesse dados diferentes que o fizessem agir de formas diferentes. Que nada!); depois, proibição de aglomeração de 50, 30, 20, 10 pessoas; até a tentativa de decreto de fechamento das entradas de municípios, tudo isso em menos de uma semana, levando o pânico injustificado à população, que, de início colaborou, mas agora se veem infrutíferas as tentativas de aumento do isolamento social, pois o "remédio" foi dado cedo demais e de maneira inconsequente. Resultado: agora que se precisaria, de fato, de maior isolamento, as autoridades não conseguem exercer o seu poder pois “queimaram” etapas no afã de marcarem posição para o seu eleitorado lembrar de suas fotografias na urna eletrônica.
Desperdiçaram medidas importantes antes da hora, e agora se veem diante da impossibilidade de implementá-las porque o apelo ao direito ao trabalho e sustento da família se faz tão imperioso quanto a pressão exercida no sistema de saúde, motivo maior do afastamento e isolamento sociais. Tão importante quanto este são aqueles, e não se pode ignorar a grande massa de trabalhadores informais, os quais, a despeito da problemática ajuda emergencial do governo, têm a sua gravíssima situação não percebida por quem, de alguma forma, conseguiu manter o seu trabalho e se encontra, dentro do possível, no conforto de seus lares, muitos deles regados a vinho, churrasco, piscina e as famigeradas “lives” que se tornaram mais uma moda da pandemia, as quais serviram, principalmente, pra nos mostrar o quanto aquele cantor é ruim sem uma magaprodução por detrás.
Miram-se em exemplos de países cuja realidade é abissalmente diferente da do nosso país. Ainda hoje vi projeções de um “estudo” sem citar metodologia, como sempre, a afirmar que a pandemia só irá terminar após o Natal. Imagino como estes estudos são tão precisos, que metodologia é essa que descobre a data exata em que tudo isso irá cessar, e coincidentemente a data sugerida é uma de grande apelo e vendedora de notícia. Agora, digam-me, por favor: que país suporta fechar a sua economia por um período tão elástico assim. Entretanto, o tempo irá se encarregar, certamente, de mostrar quais estudos se mostraram efetivos, pois ele não falha e é senhor da razão.
Tivessem sido as medidas realmente norteadas por estudos sérios e  associação de sentimentos de estadistas dos quais carecem a maioria dos nossos representantes que,  por direito têm o poder legítimo de autoridade, o resultado, sem nenhuma pretensão de exercício de futurismo, poderia ser diferente. Mas os orgulhos, interesses e ideologias são por demais arraigados e impregnados no íntimo dos que a exercem da pior maneira possível.
Diante de tudo isso, não seria de se estranhar a situação em que nos encontramos. Tamanhos desencontros na maneira de tratar de tema tão sensível nos exige, enquanto país, lutar não somente contra o inimigo comum da doença, mas também contra tantos outros não menos perigosos quanto a falta de unidade na retórica, na dialética que resvalam neste caminho tortuoso que não é bom pra ninguém, visto que, depois de tudo -  e virá um “depois” - existirá um país a ser reerguido com não menos trabalho do que hoje é requerido por quem de fato tem a responsabilidade de não nos levar ao abismo maior do que aquele que se vislumbra.
     

terça-feira, 1 de maio de 2018

HÁ VIDA ALÉM DE MEDICINA

Por LúcioTorres


Quando passo pela rua em frente aos colégios deparo-me com fotos estrategicamente dispostas de rostos alegres traduzidos pelos largos sorrisos estampados, numa estonteante reafirmação diferenciada e destoante dos pobres e vis mortais. Reflexo do marketing agressivo imposto à sociedade como pseudorreferencial de sucesso, estão lá a me mirar as juvenis e brilhosas “meninas dos olhos” dos aprovados no vestibular de medicina pela escola, num extravagante espetáculo a me querer dizer o quanto não sou nada.
Pergunto-me se existe vida além do curso de Medicina. Sim, talvez porque formador de semideuses, os futuros e virtuosos detentores do "status quo" divino sejam tamanhamente adorados como santos no altar; numa reafirmação reprodutora, errônea e excludente, a perpetuar no imaginário coletivo e senso comum a ideia de que só os bons cursam medicina, mesmo que se saiba de outras portas de entrada para inúmeras escolas médicas menos nobres neste universo, caracterizadas pelas do Estado Castrista e afins universidades sul-americanas, ou pelas particulares mercantilistas que cobram pequenas fortunas de mensalidade de seus futuros “doutores” - aliás, na realidade, é doutor quem concluiu o curso de doutorado. Estas, vendem a peso de ouro o título tão desejado e estimulado pelos diversos estabelecimentos de ensino que tomam como referencial e termômetro do seu sucesso e do alunato a aprovação única e exclusivamente, em Medicina - com M maiúsculo.
Exaltados em discursos bajuladores estratégicos, os “feras”, como são ainda chamados numa anacrônica terminologia não condizente com a realidade, já que nem se precisa ser tão fera assim para ingressar em algumas faculdades, inclusive no tão alardeado e santo curso, são o centro das atenções, fim desejado e garotos-propaganda da escola que se gaba como a melhor do mundo. E os outros? Ah, os outros são os outros, e só; reles coadjuvantes não merecedores da glória reservada para os que estão num patamar acima, afinal, quem mandou escolher outro curso? - conforme palavras de renomado  professor. Novamente me pergunto se só existissem médicos, como seria a sociedade. Restringir a importância do vestibular a um curso é restringir a multiplicidade dos elementos que formam aquela. É pequenez e erro pedagógico brutal para com a massa heterogênea do corpo discente que será o futuro desta mesma sociedade que se apequena quando privilegia uma classe em detrimento de outras não menos importantes. Resultado disso, talvez, sejam os exemplos de médicos que vemos pululando os hospitais da vida, sejam públicos ou nem tanto, os quais sequer tocam no paciente. Insensíveis, traduzem a  vocação que não possuem, porque procuraram unicamente o destaque social corroborado por toda sorte de louros dispensados pela escola e sua propaganda discriminatória e excludente.
Façamos um pequeno exercício e imaginemos um mundo só de médicos. Não haveria professores, engenheiros, arquitetos, encanadores, eletricistas e essas outras profissões menos nobres - na concepção escolar. Quem haveria de ensinar aos filhos dos ilustríssimos doutos? Quem construiria suas casas? Quem projetaria uma nova decoração, quando a antiga lhes trouxesse monotonia e tédio? Quem desentupiria o esgoto do seu prédio? - Sim, porque até os médicos produzem esgoto, como todo o mundo - Quem, enfim, lhe ligaria as luzes, daria à luz uma pessoa mais decente e verdadeira?
É que tudo não passa de superficialidade, hipocrisia e insensatez no âmbito de uma escola superficial, hipócrita e insensata que se distancia com uma velocidade galopante de valores éticos que visem à evolução humana e à construção de uma sociedade menos ruim do que a que temos hoje. Com essa postura equivocada de valorização de uma parte em detrimento do todo, tudo caminha por caminhos tortuosos os quais não se sabe bem aonde nos levarão, mas que se pode também imaginar.

A coisa


A coisa ao coisar coisa,
Porque coisando é que se coisa
A coisa que se quer.

Se não se coisasse tanto a coisa,
O pouco coisado seria o bastante
Pra se coisar. Bastando
À coisa o suficiente.

Porque, se a cada coisa basta a coisa
Presente na sua coisa,
Que outra coisa se poderia querer
Além da coisa que se tem?

terça-feira, 19 de dezembro de 2017

O whatsapp e a imbecilização humana

                                                                                      Por Lúcio Torres

  
Que a internet e suas diversas plataformas vieram para ficar, não restam dúvidas. Afinal, quem ousa imaginar o mundo sem as facilidades, sobretudo comunicativas, da pós-modernidade? Com o seu advento, nas últimas décadas, e sua constante progressão quanto ao número crescente de usuários, é mais que perceptível a sua abrangência e influência decisivas nas relações humanas contemporâneas.
A globalização, nas suas mais variadas formas e estágios, diminuiu as distâncias, extinguiu as fronteiras, aumentou a velocidade da informação e a universalizou, embora os efeitos produzidos, de certa forma, parecem ter levado a um caminho inverso quando observamos, paradoxalmente, o distanciamento das pessoas e, concomitantemente, a perda de tempo com questiúnculas supérfluas úteis em nos roubar o tempo e nos desviar a atenção do essencial, simples e primitivo da vida.
Importa assinalarmos o altíssimo grau de dependência que a sociedade hodierna conseguiu agregar, a ponto de ficar refém – e isso não é um exagero. Experimente ficar um dia inteiro sem o celular – da rede mundial. Constata-se sua influência no comportamento e relações interindivíduos, tendo como resultado o constante e progressivo distanciamento entre os atores, por mais contraditório, repito, que pareça.   
Não é difícil, ao contrário, averiguar-se que, embora presentes as pessoas são distantes.  Isso em todas as esferas ou grupos sociais, quer seja na família, na escola, na rua, no trabalho, na repartição pública – ou privada – , no lazer, enfim, em todos os locais possíveis nos quais haja uma rede wi-fi, lá está a internet e o celular, amigos inseparáveis, como um obstáculo onipresente à nossa primária forma de interação.
Ao se caminhar nas ruas, cruzamos com zumbis errantes, daqueles que aparecem no cinema. Em toda parte, pra onde quer que a vista aponte, percebe-se uma massa alheia ao que acontece ao derredor, concentrada no aparelhinho celular, contribuindo para o surgimento de uma geração de pessoas de “pescoço caído” – os fisioterapeutas que o digam. Isto é por demais sério, porém não me parece ser tratado com a seriedade merecida por quem de direito.
Como tudo que o homem bota a mão – desde os primórdios bíblicos – é afetado intrinsecamente pela sua capacidade e vocação de estragar o que é bom, não acontece diferente com a internet e suas derivações aplicativas, entre elas a mais popular em nosso meio, o famigerado whattsapp e sua ferocidade em alastrar boatos, atrofiar mentes e imbecilizar pessoas.
Falando dessa forma, parece que não há nada que se aproveite nesta plataforma. Não é bem assim. Como outras invenções não menos importantes, o problema não está nelas em si, mas em nós e em todos os nossos defeitos que se perpetuam ad infinitum por séculos e séculos sem fim – me perdoe a redundância. Como dito, o homem tem uma capacidade inata de deturpar, piorar e corromper o que é bom. Eis a questão! Parece-me que o aplicativo nada mais faz do que desnudar realmente o homem como ele se apresenta: falho. E aqui não há barreiras de ordem cultural, social, política, ideológica, ou o que quer que seja que nos faça escapar de nossa própria insensatez. Todos nos transformamos num só idiota.
Neste ponto, cabe uma análise mais apurada.  Mesmo pessoas com formação e grau de instrução diferenciados parecem sucumbir diante da bestialidade a que são submetidos e se deixam levar por ela, acabando por se tornarem sujeitos desprovidos de senso crítico, embarcando num status quo característico do senso comum. Tal observação corrobora para uma falha crassa na educação a que foram submetidos, educação esta que não se restringe unicamente à oportunidade de frequentar “bons” colégios. Estes indivíduos, de quem se esperava pelo menos um fio de sapiência, nos fazem refletir e indagar sobre em qual estágio o processo educativo não se realizou – sobre isto muito teríamos que discorrer: as faltas da educação, da escola e por que não dizer, da família.
Particularmente me chama a atenção no uso da ferramenta a postagem de notícias sem verificação de autenticidade. Não se deve esquecer que, dado às características da rede, a velocidade da informação é impressionante, tanto quanto a ânsia pelo “furo” de reportagem – sim, pois na era da internet todos somos jornalistas, repórteres, enfim, imprensa. Porém, a fonte quase nunca é checada, como o fazem os jornalistas de verdade, pois isso dá trabalho e leva tempo, o que não é interessante no que concerne à rede mundial – a “perda de tempo”. Assim, lá se vai uma notícia falsa se alastrando como fogo posto num rastilho de pólvora. Essa armadilha é democrática. Ela atinge a maioria dos usuários, independentemente do grau de instrução e já implicou problemas e aborrecimentos para pessoas que sofreram processos caluniosos e difamatórios. Motivo pelo qual, dado a esta característica do aplicativo, ou melhor, de quem o usa, não é prudente usá-lo como meio de se informar.
Não bastasse tudo isso, cabe ainda somar os inúmeros mal-entendidos entre os interlocutores, próprios da dificuldade natural de se escrever o que se está falando, haja vista as diferenças entre a língua escrita e falada, o que tem levado – não raramente – a discussões e/ou desavenças entre “amigos”. Sem falar nas duas barras azuis que “entregam” quem viu a mensagem, a qual, se não respondida a contento e no tempo esperado, dá margem a interpretações, nem sempre corretas – pelo menos não para quem as deduz – do emitente.
Problemas de ordem psicológica também são afloradas e traduzidos pela ânsia de se ser correspondido e intensificados por uma autoestima baixa e pela necessidade de aceitação no grupo social. Desta forma, são desnudados comportamentos, nem sempre saudáveis, de uma sociedade que, por sua vez, mostra-se doente sob os mais distintos pontos de vista.
De novo, parece não ser a ferramenta perversa em si mesmo, mas aqueles que carreiam por meio dela toda sorte de vícios, os quais, outrora, eram concretizados por outros recursos, mais lentos, menos abrangentes e menos efetivos na disseminação de informação, como a velha fofoca ao pé do ouvido em grupos sociais restritos, por exemplo.
Carecemos, portanto, de exercer em plenitude os tão fora de moda valores éticos. “Tudo posso, mas nem tudo me convém”, parodiando Saulo de Tarso. Os sujeitos necessitam tomar para si a responsabilidade da saudável convivência e respeito pelo outro. Não é porque tenho à disposição um instrumento que me dá voz ativa e capacidade de ser ouvido, que posso usá-lo indistintamente ao meu bel prazer. Este é um problema ainda a ser equalizado dentro da rede mundial e depende de fatores outros aqui citados, como a educação. No entanto, tudo parece estar contaminado por algo bem maior. Neste sentido, algumas perguntas poderiam ajudar no seu discernimento: Eu postaria este ou aquele conteúdo em um outdoor? A minha postagem contribui, de alguma forma, para a edificação de quem as lê? Eu gostaria de receber uma mensagem igual? – esta, propriamente pode não ser tão efetiva. Perguntas assim, de certo, ajudariam muito na melhoria e na seletividade do conteúdo que se vê por aí, estampado nas mensagens de texto ou imagens e vídeos que empanturram a memória do celular com a superficialidade humana.
Mas não tomem como por demais pessimistas as assertivas acima, visto que ainda há esperanças. Apesar de todos os malefícios, vislumbra-se uma luz no final do túnel cada vez que a plataforma é usada de forma responsável – como deveria ser sempre –, não fosse o homem este ser intrínseca e extrinsecamente complexo demais para só realizar coisas boas.







quarta-feira, 25 de maio de 2016

ALGUÉM


Não me diga o quão triste te parece ser este alguém que te apresenta como quem te ama, mas, ao invés de tudo se contradiz nas imperfeições demonstradas.

Porque, mais que ninguém, eu sei o que ele sente e quando ri e quando chora e quando quer dizer o que não diz e sofre por dentro mais do que por fora dessa imprecisão que o aflige.

Mas agora permanece quieto, mais calado do que ainda pode ser alguém que chora a falta do que falta ao seu ânimo mais contrito da profunda angústia que o atormenta.

terça-feira, 24 de maio de 2016

ALGUNS HAICAIS

O exercício de expressão na sutileza de três versos


O vinho é o bálsamo
Derramado na ferida
Que alivia a dor


Da lua o clarão
A iluminar o meu quarto
Minha solidão


Na molhada relva
O sereno de uma noite
Escorre na terra


A lua cheia
Ilumina o quarto à espera
Dos namorados


Cold and silent night
I look for the stars, but they ...
They were already lie


Acima das nuvens
A imensidão e o espaço
Nos tornam pequenos


O pobre poeta
Pensa que é interessante!
Que nada. Piada!


Sopé da montanha
Vale na rocha escupido
Sob o céu nublado


O amor é brisa
Do fogo da existência
Alimento e chama


Festa de criança
É não se preocupar
Viver o momento


Dunas, céu azul
Brisa, mar, vegetação
Natureza viva


À brisa marinha
Um casal de bem-te-vis
Canta ao entardecer


Num dia nublado
A garça percorre a relva
Tingida de verde

segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

ANAIS DO BOCÃO: ÓCIO E PÉROLAS



       Porque o ócio é capaz de grandes preciosidades que somente os grandes são capazes de produzi-las. Tanto que no antigo Império os mais importantes intelectuais – a exemplo de Cícero e Sêneca – de Roma o tinham arraigado no seu íntimo. Não à toa nós, remanescentes do ginásio – novinho do tempo de ginásio! – do grande Colégio Sete de Setembro - àquele que só se ama uma vez, a primeira e para sempre – também produzimos durante o corrente ano inúmeras pérolas, não menos dignas de registro – nem de modéstia.
       Torna-se efetivamente pertinente elencá-las dado o crescimento da família do Bocão, que aumenta a cada dia, visto que os novatos poderão ficar um pouco perdidos diante da enxurrada de mensagens e atualizações que parecem surgir à velocidade da luz, principalmente em se tratando de conversas nas quais um dos interlocutores é a nossa calada amiga Sandra e sua constante falta de assunto.
       Assim foi que no último ano passeamos nossas intrépidas línguas nesta magnífica plataforma tecnológica, mas, ao mesmo tempo tão cruel em matéria de mal-entendidos e melindres, a qual não perdoa o mínimo deslize dos seus componentes, chamada WattsApp – intimamente conhecida por zap zap por nós Tupiniquins.
      Como esquecer, por exemplo, de nossa amiga Sandra Tartá – olha ela de novo! – e sua perspicácia datação dos Livros Sagrados. Pois bem, numa das citações da Bíblia – como o faz de costume. Só perdendo para Edsão (perdoem-me a grafia) – a nossa amiga foi longe ao afirmar que os escritos sagrados tinham “cinco milhões de anos” – acho que nesse tempo só tinha dinossauros na terra. Espero não estar enganado para que eu não seja obrigado a me colocar também nesse relato. Não que eu não o esteja, como veremos a seguir.
     Parodiando Geraldo Vandré, pra não dizer que não falei de mim, certa vez – como acredito que muitos de vocês fazem diante do grande número de mensagens que vemos na telinha após um pequeno período sem checar o celular – comecei a olhar e ouvir as mensagens de trás pra frente e salteadas – achei que assim daria para contextualizá-las – e deduzi erroneamente que era o aniversário de Alexandre, visto que todos o parabenizavam. Então gravei um áudio no qual também o parabenizava pelo seu dia e desejava felicidades. Pouco depois – o magnífico feedback à velocidade da luz – Wheidy Maria – é assim que vou chamá-la de agora em diante – entrou com um áudio a me alertar do meu engano, pois não se tratava do aniversário de Alexandre. Eu, prontamente e inocentemente gravei outro áudio no qual eu retirava tudo o que havia dito. Isso mesmo! Eu retirei tudo o que disse! – isso incluía, naturalmente, os desejos de felicidades, tão bem lembrado pelo áudio da amiga Wheidy Maria.
      Nossa amiga Ilka também esteve presente no que chamamos carinhosamente de “Os Anais do Bocão” do qual eu sou – como vocês puderam perceber – o relator e anotador contumaz. Perdoe-me o trocadilho, mas não havia melhor momento pra se falar dos anais do que este ao lembrar da eloquente firmeza verbalizada por Ilka ao protestar que nós não vivíamos “no furico do mundo”.
      Vocês sabiam que Alexandre toma “Navagina” quando está com dor de cabeça? Como sou uma pessoa compreensiva resolvi não colocar esse episódio nos anais – olha ele aí de novo! –, pois o grande tempo sem falar português com freqüência – agora ele tem a nós para praticar – o deixou, como ele mesmo nos disse, “enferrujado” no uso da língua materna e capaz de cometer essas impropriedades.
      Convém também lembramos as intermináveis conferências de Sandra, Mônica, Cynthia e Wheidy a respeito de como rejuvenescer – como se isso fosse totalmente possível – nas quais eram discutidos os mais revolucionários métodos para tal, como ioga facial antirrugas, cremes variados, além de receitas caseiras que não sei se foram postas em prática. Se bem que Sandra enveredou mesmo pelo caminho radical da cirurgia, ao invés de esperar pelos resultados das citadas conferências – mas não foi a doutora Rola, indicada por Alexandre, que operou nossa amiga, pois ela não tinha agenda, infelizmente.
      Como toda família, no bocão também há algumas discussões devido a divergência de opiniões – isso acontece nas melhores famílias – e choque de temperamentos. Nada que não termine bem com um abraço virtual e fraterno. Aliás, o tempo passou e – ainda bem – nos conservou a essência de nossas personalidades. Isto foi percebido nestes acontecimentos os quais nos fazem remontar ao tempo da escola. Cada qual permaneceu, na maioria dos casos, com sua identidade – que bom!
      Mas o que nos marcou profundamente foi mesmo o encontro que realizamos com alguns membros quando da vinda de Wheidy e Luca. Passamos uma tarde bastante significativa na qual tivemos a oportunidade, depois de tantos anos, de nos rever e aos nossos cônjuges meeiros – segundo Cynthia – e filhos. Foi como que uma renovação, um revigoramento, agora acrescido de novos membros a dar continuidade no que outrora fomos e somos – amigos, família. As novas gerações se encontraram e começaram a criar vínculos. Foi assim no encontro entre os filhos de Murilo, Wheidy e Ilka, que jogavam futebol nos jardins da chácara de Sandra aos olhares contemplativos dos pais e amigos. Lembramos-nos de acontecimentos que parecíamos não lembrar. Até ficamos sabendo de traumas psicológicos passíveis de reparação indenizatória a ser impetrada contra Murilo por Sandra devido a Buylling – no nosso tempo nem existia isso – e constrangimento ao zombar da roupa rasgada e da suposta indignidade de pertencer à selecionada casta dos alunos do Sete de Setembro da impetrante. Depois deste curto momento, a despedida na tapiocaria significou tanto que fez Murilo derramar lágrimas, que segundo ele, não derramava desde a morte de sua avó. Foi uma boa noite.
      Assim, neste breve resumo espero ter conseguido transmitir as boas vindas aos recém-chegados e que eles possam ter uma vaga ideia do que temos feito e debatido e acontecido aqui, na continuidade do primitivo bocão mimeografado no qual a criatividade de jovens amigos posta no papel atravessou o tempo e os fez o reencontro perceber o quão boa é a vida e as amizades que se fazem no seu decorrer.